Uma equação diferencial é uma equação em que a incógnita é uma função (y(x)), e que estão presentes
as suas derivadas (y′(x), y′′(x), etc) assim como uma variável independente (x).
Existem dois tipos de Equações Diferenciais:
Equações Diferenciais Ordinárias: Uma equação diferencial é ordinária quando o domínio da função y(x) está contido em R, isto é, tem apenas 1 dimensão. Por exemplo:
y′=xy
Equações Diferenciais Parciais: Uma equação diferencial é parcial quando o domínio da função u(x1,x2,…,xn) está contido em Rn, isto é, tem dimensão superior a 1. Por exemplo:
Equações Diferencias Ordinárias (EDO) de Xª ordem: A ordem de uma EDO é dada pela maior ordem da derivada que existe na equação.
Por exemplo, a equação
x′′+t2x′+sinx=arctant
é de 2ª ordem (a incognita é uma função x(t)), enquanto a equação
dsdu=ue5+s2+u2
é de 1ª ordem (a incognita é uma função u(s)).
Exemplo
O volume v(t) de líquido num tanque (v em litros, t em segundos) é, no instante inicial t=0, igual a 3 litros. Sabendo que o tanque enche à razão de 0.1 litros por segundo, determine o volume de líquido no tanque ao fim de 10 segundos.
Este exercício é muito simples e pode-se resolver facilmente de cabeça: 3+0.1×10=4L.
No entanto, podemos também aplicar cálculo diferencial e reescrever o problema numa EDO:
v′(t)=0.1v(t)=∫0tdtdvdt=∫0t0.1dt=0.1t+c
Como sabemos que v(0)=3, temos que v(t)=3+0.1t, o que já tínhamos concluído de uma forma mais simples.
No entanto, o que acontece agora se alterarmos a razão para 100t?
Tentar calcular agora intuitivamente não é fácil, visto que a razão inclui uma variável.
Temos assim de aplicar o mesmo raciocínio que usámos anteriormente, com uma EDO:
v′(t)=100tv(t)=∫0tdtdvdt=∫0t100tdt=200t2+c
Obtemos então v(t)=3+200t2, sendo que com t=10, temos v(10)=3+200102=3.5
Alterando agora a razão para 100t−100v (como se tivesse um "furo")
v′(t)=100t−100v
Esta equação é uma EDO escalar de 1º ordem linear, ou seja, é do tipo dtdv=a(t)v+b(t).
Neste caso, a=−1001 e b=100t
Temos então de descobrir v(t):
{dtdvv(0)=100t−100v=3
v(t)=∫0tdsdvds=∫0t100s−100vds=200t2−100vt
Poderíamos isolar v(t), atendendo ao domínio, mas o exemplo até agora demonstra a importância de saber resolver EDOs.
Mais à frente veremos como podemos resolver equações deste tipo.
Quando uma EDO na variável x vem associada com uma condição inicial x(t0)=x0, dizemos que temos um Problema do Valor Inicial (PVI).
EDO Lineares
Definição
Uma EDO de primeira ordem é linear se se pode escrever na forma
dtdx=a(t)x+b(t)
Consoante a nulidade de a(t) e b(t), temos várias formas de resolver uma equação deste tipo.
Exemplos simples
Equação diferencial ordinária de 1º ordem:
y′=et⇔y(t)=et+c
Ou se soubermos um caso específico, e.g. y(0)=2, podemos descobrir c: y(t)=et+1
Equação diferencial ordinária de 2º ordem:
dt2d2x=etdtdx=et+cx=et+ct+d
Caso a(t)≡0 - Integração Direta
Neste caso, como a(t)≡0, temos que dtdx=b(t).
Este é o caso mais simples, pelo que podemos obter
x′(t)=b(t)⇔x(t)=∫b(t)dt+c
Se tivermos um valor inicial x(t0)=x0, obtemos a função x(t):
∫t0tdsdxds=∫t0tb(s)ds
x(t)=x0+∫t0tb(s)ds
Caso b(t)≡0 - Homogéneas
Neste caso, como b(t)≡0, temos que dtdx=a(t)x.
Assim obtemos a seguinte fórmula (para qualquer K∈R):
x(t)=Ke∫a(t)dt
Prova
Note-se que x(t)≡0 é trivialmente uma solução.
Assumindo que x(t0)=0 para algum t0, temos que, numa vizinhança desse ponto:
x′=a(t)x⇔xx′=a(t)⇔ln∣x∣=∫a(s)ds+C⇔x=±eCe∫a(s)ds
para algum valor de C∈R. Por continuidade de x (note-se que x é diferenciável), temos que C tem o mesmo valor em todos os pontos do domínio, pelo que a solução toma forma
x(t)=Ke∫a(t)dt
em que K é uma constante real não nula. Unificando com a solução nula, obtemos o resultado pretendido.
Novamente, se soubermos um valor que pertence à função, por exemplo, x(t0)=x0, podemos descobrir diretamente a função x(t):
x(t)=x0e∫t0ta(s)ds
Caso Geral - Não Homogéneo
PRO TIP
É recomendado saber os casos particulares de cor em vez de usar o caso geral para lá chegar,
pois são consideravelmente mais simples.
O caso geral ocorre quando nada se pode assumir sobre a nulidade de a(t) e b(t).
Ficamos assim com a expressão, em que a,b∈C:
dtdx+a(t)x=b(t)
Para resolver este tipo de equações, utilizamos uma função auxiliar, denominada fator de integração.
O fator integrante é uma função μ:R→R (normalmente representada pela letra grega "mu"), tal que μ′=a(t)μ.
Esta função permite-nos reduzir o caso geral aos casos mais simples que já sabemos resolver:
Começamos por multiplicar todos os membros da equação por μ:
x′μ+a(t)xμ=b(t)μ
Utilizar as regras de derivação para simplificar a expressão:
Sabe-se que μx′+a(t)μx=μx′+μ′x=(μx)′, pelo que obtemos
(x⋅μ)′=b(t)μ
que é uma EDO resolúvel por integração direta.
x⋅μ=∫b(s)μds+C⇔x(t)=∫μ(t)μ(s)b(s)ds+μ(t)C
Note-se que a equação que define o fator integrante: μ′=a(t)μ é linear homogénea de primeira ordem. Podemos então descobrir μ, pela fórmula do caso b(t)≡0 .
μ′=a(t)μ⇔μ(t)=Ke∫a(s)ds
Substituir o μ obtido em 3. na expressão obtida em 2. determinando o conjunto solução da EDO.
Exemplos
Tomando a equação e um ponto,
y′+2ty=ty(0)=1
queremos determinar a expressão que define y(t).
Começamos por multiplicar todos os membros por μ:
(μy)′=μy′+μ′yμy′+μ⋅2tμ′y=μt
Simplificando agora a expressão, ficamos com μ′=2tμ e
(μy)′=μt
Queremos agora descobrir μ, pelo que podemos usar a fórmula do caso b(t)≡0.
μ′=2tμ⇔μ=et2
Não é necessário incluir a constante porque essa é adicionada na expressão abaixo.
Substituindo agora os valores na expressão em (2), obtemos:
Como sabemos que y(0)=0, temos y(0)=1+00+202+c=c⟹c=0.
Assim, a expressão que define y(t) é:
y(t)=1+tt+2t2
Alternativamente, pode-se utilizar o seguinte teorema (Teorema da Variação das Constantes), mas nem sempre se justifica aplicá-lo:
Se tivermos uma EDO deste tipo associado a um valor inicial x(t0)=x0 obtemos a solução:
x(t)=x0e∫t0ta(z)dz+∫t0tb(s)e∫sta(z)dzds
Equações Separáveis
As equações separáveis generalizam a ideia que usámos no caso homogéneo de passar os termos que dependem de y para um só lado da equação.
Seja y(t0)=y0 e uma equação
y′=f(y)g(t),f(y0)=0
com f e g contínuas numa vizinhança de y0.
Então temos que
f(y)y′=g(t)⇔F[y(t)]=∫g(t)dt+C
em que F é uma primitiva da função f. Note-se que este resultado não oferece uma
solução explícita para y, mas uma solução implícita. Contudo, como F′(y0)=f(y0)=0, podemos aplicar o Teorema da função implícita para afirmar que a equação acima tem uma solução única numa vizinhança de y0.
Como y(t0)=y0, podemos especificar que a equação
F[y(t)]=F(y0)∫t0tg(s)ds
define uma solução única para o PVI, numa vizinhança de y0.
Exemplo
Considerando a seguinte equação
dtdy=(cos2y)cost
e y(0)=π, determine a expressão que define y(t)
cos2y1dtdy=cost⇔F(y)tany=G(t)sint+c
tanπ=sin(0)+c⇔c=0
Assim temos que:
tany=sint
A função tangente não é invertível, pelo que temos de atender ao domínio e à condição y(0)=π
y=π+arctan(sint),t∈R
Mais Exemplos
Consideramos a seguinte equação
dtdy=cosyty(0)=π
e queremos determinar a expressão que define y(t).
cosydtdy=tsiny=2t2+csinπ=c,⟹c=0siny=2t2
Temos assim como solução y=π−arcsin2t2, atendendo que o domínio tem de ser tal que a derivada da expressão seja contínua.
Assim, precisamos que 2t2∈]−1,1[, ou seja, t∈]−2,2[
Consideramos a seguinte equação
y2dtdy=3t8y(0)=0
e queremos determinar a expressão que define y(t).
3y3=3t9+c0=0+c⟹c=03y3=3t9
Temos assim:
3y3=3t9⇔y3=t9⇔y=3t9⇔y=t3
Consideramos a seguinte equação
dtdy=t(y2−1)
e queremos determinar a expressão que define y(t).